sexta-feira, 12 de novembro de 2010
O Brilho
Ele nunca se contentou com a superfície. Gostava de imergir até a pressão ser quase insuportável. Tão fundo onde apenas uns pequenos detalhes colorido são revelados pela luz, e o som interior ensurdece a voz da razão. Diante do fim de um longo relacionamento amoroso, o isolamento foi sua primeira reação. Contudo, um grupo de amigos obstinados a reanimá-lo, aproveitando as justificativas carnavalescas, levaram-no a uma boate.
Definitivamente ele não queria estar ali. Não conseguia formular uma frese que não enrugasse a testa das meninas. Beijar na boca e ir para casa sozinho estava fora de cogitação, um abacia de pipoca na cama lhe parecia muito mais agradável. Como se não bastassem as pressões dos amigos para ele ser feliz, toda aquela selvageria de fevereiro e o calor do Rio, uma luz inconveniente insiste em ofuscar sua vista. Era uma das estrelas decorativas.
O teto estava ornamentado com estrelas de papel, cobertas por purpurina prateada e penduradas com fios de nylon. Havia estrelas de diversos tamanhos espalhadas, mas esta era a única que refletia a luz do laser direto nele. A estrela dançava no ar, embalada pelos ventiladores e num desses rodopios, quando a paciência dele já estava no limite, espelhou para baixo, como um foco, revelando-lhe o sorriso mais encantador que conhecera.
Ela estava de máscara, o que dava aos seus lindos lábios uma evidência mágica, capaz de atraí-lo instantaneamente. Ele aproximou-se o suficiente para que fosse notado, e sob a estrela dançante seus olhos se encontraram. Ela sorriu ainda mais deslumbrante, e com uma leve mordida no lábio inferior o convidou. Ele chegou bem perto sem desviar o olhar, segurou no rosto dela e conduziu carinhosamente a mão até a nuca antes do beijo.
Toda a eternidade estava contida naquele instante. O tempo, o espaço, a matéria, o ser, nada tinha limites, nada tinha dimensões, nada era mais importante que o presente. O tempo presente, o presente da vida, o beijo, que foi interrompido inesperadamente. A estrela, por causa do calor ou do vento, despencou sobre o beijo. Desorientado, ele reparou que a estrela deixara purpurina naquele lindo sorriso, antes de parar no chão.
Enquanto ele abaixava para pegar a estrela, ela foi arrastada pela amigas na direção do bar, e antes que pudesse esboçar qualquer reação de resgate, um de seus amigos precisou ser levado ao hospital. Sem nenhuma forma de localizá-la, ele guardou aquela estrela cadente.
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